quarta-feira, 9 de agosto de 2017

A fileira do eucalipto em Portugal: mitos e realidades

A QUERCUS e a ACRÉSCIMO confrontaram as informações difundidas pela CELPA, Associação da Indústria Papeleira sobre as florestas, a atividade silvoindustrial e a fileira da pasta e papel em Portugal, com as estatísticas oficiais disponíveis e chegaram a conclusões.

 Eis os 12 itens essenciais:
  
1.    Em Portugal, 98% da área florestal é detida por famílias?

Não! Em Portugal, o Estado dispõe apenas de 1,6% da área florestal nacional. A indústria papeleira detém cerca de 6,5%, muito embora, entre 2001 e 2010, a mesma tenha registado uma contração, apenas em plantações de eucalipto, superior a 33,8 mil hectares, Da área restante, as áreas comunitárias, os baldios, representam cerca de 12%.

Assim, as famílias serão detentoras de cerca de 80% da área florestal nacional

2.    Existem 400.000 proprietários com plantações de eucalipto em Portugal?

Não existem estatísticas fiáveis, pela ausência de cadastro rústico em parte significativa do país, quanto ao número de proprietários rústicos detentores de superfícies florestais.

O número de 400.000 proprietários é um valor desactualizado relativo ao total de proprietários florestais que detêm várias espécies e não apenas dos produtores de eucalipto.

Através das Finanças, em dados de 2006, sabe-se que o número total de prédios rústicos em Portugal ascende a quase 11 milhões, sendo que, em 14 dos 18 distritos do continente, a área média dos prédios é de 0,57 hectares.

3.   As plantações de eucalipto representam apenas 13% da área ardida em Portugal?

Não! Nos últimos 20 anos, a área de plantações de eucalipto em Portugal registou um acréscimo superior a 100 mil hectares. O seu envolvimento na área ardida tem crescido substancialmente.

Em 1996 as plantações de eucalipto representavam 3% da área ardida total e 13%, da área ardida em floresta.

Em 2015 a área ardida de eucaliptal representou 17% do total e 45% da área de povoamentos florestais ardidos.

4.   A área de plantações de eucalipto em Portugal é objeto de uma adequada gestão?

Não! A par do que acontece com outras ocupações florestais, também a área de plantações de eucalipto evidencia enormes debilidades no que respeita à sua gestão. Uma grande parte dos eucaliptais em minifúndio do centro e norte do país, não tem qualquer gestão de silvicultura preventiva durante a década até ao corte.

Assim, de acordo com os últimos dados disponíveis do Inventário Florestal Nacional (IFN5), da área nacional ocupada por eucalipto, em cerca de 11% trata-se de povoamentos mistos com pinheiro-bravo, em cerca de 9% o coberto é inferior a 50%, em cerca de 49% a densidade é inferior a 600 árvores por hectare, e em cerca de 12% a idade das plantações ultrapassa os 12 anos. Todos estes são indicadores de deficiente e má gestão.

5.    A área de plantações de eucalipto está 100% certificada?

Não! A área ide plantações de eucalipto dos grupos industriais associados na CELPA, cerca de 19% da área total de eucalipto a nível nacional (segundo dados provisório do 2010, IFN6), estão certificadas pelos sistemas FSC e PEFC. As áreas totais das empresas associadas na Celpa representam 56% da área certificada pelo FSC e 78% da área certificada pelo PEFC.

6.    A produção de rolaria de eucalipto é um negócio rentável?

Se avaliado o negócio da produção de rolaria de eucalipto conforme os dados apresentados no simulador “Análise Financeira para o Eucalipto”, desenvolvido pela própria indústria papeleira, os resultados positivos tendem a aparecer.

Importa, contudo, ter em consideração as limitações de tal simulador. O mesmo tem uma fortíssima limitação para 14 dos 18 distritos do continente, onde a área média dos prédios é de 0,57 hectares, ou seja, onde o minifúndio acarreta custos específicos não considerados. Por exemplo, o encargo considerado de 1.350 euros/hectare de instalação de um eucaliptal, em minifúndio, pode atingir os 3.000 hectares/hectare.

É de realçar ainda o facto de os valores de custos apresentados no simulador estarem aquém dos valores de referência, para as operações em causa, definidos por comissão de acompanhamento sediada no Ministério da Agricultura.

Por último, as simulações ocorrem a 24 anos (2 cortes a cada 12 anos), não incluindo valores relativos a cortes posteriores, com produtividades decrescentes, bem como o encargo final de replantação ou reconversão do uso do solo para outras produções. Este último, em minifúndio, pode atingir os 2.000 euros/hectare.

7.    A fileira do eucalipto combate o despovoamento?

Não! A expansão de plantações de eucalipto em regiões despovoadas do interior em nada contribuiu para contrariar o êxodo rural. A cultura do eucalipto baseia-se em praticas culturais simples e numa procura que se centra, sobretudo, no litoral, longe de regiões de baixa densidade populacional. A principal exceção ocorre em Vila Velha de Ródão, onde a atividade industrial se tem caracterizado por um elevadíssimo custo ambiental.

8.    O sector florestal representa 100 mil postos de trabalho?

Não! No seu conjunto, a silvicultura e as indústrias florestais sustentam, de acordo com dados de 2013, cerca de 66 mil postos de trabalho. A silvicultura é responsável por cerca de 5 mil postos de trabalho e as indústrias florestais, nas suas diferentes fileiras, por cerca de 61 mil empregos.

9.   O sector florestal em Portugal representa 5% do PIB?

Não! De acordo com os dados do INE, em 2013 o Valor Acrescentado Bruto do sector florestal representava 1,2% do PIB. A indústria papeleira tinha um peso de 0,5% do PIB.

10.  As importações de eucalipto para a indústria papeleira têm aumentado?

Não! No que respeita às importações de rolaria de eucalipto, tem-se assistido a uma redução desde 2013, isto, apesar do aumento nas aquisições.

11. As plantações de eucalipto têm tido um impacto relevante no sequestro de carbono em Portugal?

Não! No curto prazo o sequestro de carbono é mais rápido pelo eucalipto, contudo, em termos de cenários das alterações climáticas é mais relevante que o carbono fique armazenado no máximo período de tempo, o que se anula com o corte e transformação industrial do eucalipto.

Há que ter ainda em conta o desempenho crescente das plantações de eucalipto na área ardida, pelo que importa avaliar o saldo entre o ganhos e as perdas decorrentes das emissões libertadas pelos incêndios.

12.  Para tornar rentável a operação industrial de produção de pasta e de papel o país carece de maior área de plantações de eucalipto?

Não! Quanto muito será oportuna a aposta em qualidade e na produtividade por área. Ora, o que a CELPA agora defende são novas plantações de eucalipto, aumentando as monoculturas com os riscos associados.

A informação difundida pela indústria papeleira em Portugal está demasiado fundamentada em mitos, pouco na realidade.

____________

INFORMAÇÃO ADICIONAL:

1.     Portugal é, na União Europeia, o Estado Membro como menor área de floresta pública.



2.     Ao nível dos mercados, uma procura fortemente concentrada, como ocorre na fileira do eucalipto, implica uma forte capacidade negocial do lado da oferta, facto que se torna inviável para muitas famílias, mais ainda na ausência de regulação por parte do Estado.

3.     No que respeita ao impacto das plantações de eucalipto, a evolução registada evidencia uma tendência bem definida, sobretudo, no que respeita à área ardida em povoamentos florestais.




Ou seja, mais expansão, maior o risco.

Na primeira década do século, as plantações de eucalipto assumiram destaque na distribuição da área de povoamentos ardidos por espécie



4.     Importa ter em conta que, apesar de uma expansão em área de cerca de 100 mil hectares, registado entre 1995 e 2010, a produtividade média anual manteve-se em cerca de 6 metros cúbicos por hectare e ano.



5.     Admitindo que as plantações de eucalipto são maioritárias na área florestal sujeita a certificação da gestão, importa ter em conta que o FSC tem certificados um total de 377 mil hectares (a 02/05/2017), o PEFC de 257 mil hectares (a 29/05/2017), que existem interseções de áreas entre os dois sistemas, e que o universo é de 812 mil hectares de plantações de eucalipto a nível nacional, segundo dados oficiais de 2010.

6.     Simulador “Análise Financeira para o Eucalipto”, desenvolvido pela Celpa, Associação da Indústria Papeleira, com cofinanciamento do PDR2020:

Matrizes da CAOF, Comissão de Acompanhamento das Operações Florestais:

7.     A cultura do eucalipto ajusta-se, sobretudo, a proprietários ausentes do meio rural, com atividade profissional e rendimento familiar oriundo principalmente de outras origens, ou a proprietários que, embora residentes junto das suas propriedades, não tenham já condições físicas para a exploração de ocupações do solo mais exigentes em termos culturais. Em última análise, pode ser associada a uma cultura que estimula a preguiça.

Não existem indicadores oficiais que relacionem a expansão das plantações de eucalipto com a fixação ou aumento da população rural.

8.     Entre 2002 e 2011, apesar da expansão da área de plantações de eucalipto em Portugal e do aumento da capacidade instalada na indústria papeleira, o número de postos de trabalho no conjunto das indústrias florestais contraiu em mais de 32 mil empregos.

Aparentemente, o emprego no sector florestal depende de outras condicionantes, não do aumento da área de plantações de eucalipto ou do acréscimo de capacidade instalada por parte da indústria de pasta e papel.

9.     No que respeita à evolução do saldo da balança comercial por indústria florestal, no período de 2008 a 2011, os aumentos mais significativos ocorreram nos produtos resinosos (3.894%) e na indústria do mobiliário (386%).

10.   De acordo com os dados disponibilizados pela associação da indústria papeleira:



11.   A floresta nacional é um reservatório de 265 Mt CO2eq [de carbono] e sequestra 13,5 Mt CO2eq por ano. Tratando-se de uma espécie de crescimento rápido, a eficiência de sequestro e potencialmente mais evidente no eucalipto face a outras espécies.

Os incêndios têm um impacto considerável nas emissões de gases de efeito estufa. Para o ano de 2003, estima-se que os gases libertados tenham ascendido a 7,39 Mt de CO2 eq (nesse ano a área ardida em povoamentos correspondeu a 51% da área ardida total, sendo que a área ardida em eucaliptal correspondeu a 18% da área ardida total e a 35% da área ardida em floresta).

12.   Portugal dispõe da 5.ª maior área de plantações de eucalipto a nível mundial. Em termos relativos, Portugal assume a 1.ª posição.



Apesar da área disponível, o país regista uma produtividade média muito baixa, de cerca de 6 metros cúbicos por hectare e ano.



Sem comentários:

Enviar um comentário