terça-feira, 9 de setembro de 2014

FSC e PEFC não garantem o acompanhamento à eliminação de resíduos em florestas certificadas

Desde há um ano que a Acréscimo tem vindo a solicitar a visita a locais de eliminação de resíduos em solos de florestas certificadas geridas por empresas papeleiras. Tal ainda não foi autorizado.

A Acréscimo desenvolveu ainda contatos com o Forest Stewarship Council (FSC) e com o Programme for the Endorsement of Forest Certification (PEFC), para averiguar do seu posicionamento quanto à eliminação de resíduos em áreas florestais certificadas. Do PEFC não houve qualquer esclarecimento. O FSC Internacional respondeu, contudo a informação transmitida parece contrária à prática evidenciada a nível nacional.

Apesar de presentes em Portugal há mais de uma década, a evidencia da monitorização à eliminação de resíduos em florestas certificadas não tem feito parte da agenda nas auditoriais realizadas no âmbito do sistemas FSC e PEFC.

Para além dos impactos ambientais associados a esta prática, a aplicação de resíduos industriais em silvicultura pode aportar consequências nefastas para a saúde pública.




A possibilidade de eliminar resíduos nos solos está enquadrada pela Diretiva 86/278/EEC, do Conselho, de 12 de junho (Diretiva Lamas), transposta ultimamente para o regime jurídico português através do Decreto-lei n.º 276/2009, de 2 de outubro.

No âmbito da aplicação da Diretiva Lamas, Portugal tem a obrigação de apresentar relatórios trienais de monitorização, conforme o disposto no Art.º 5.º da Diretive 91/692/EEC, do Conselho, de 23 de dezembro. Desconhecem os eventuais relatórios produzidos após 2009.

Em Portugal, o Ministério do Ambiente fiscaliza a gestão dos resíduos, muito embora vários estudos ponham seriamente em causa a eficácia do seu desempenho. Tais estudos referem do desconhecimento do destino de cerca de 50% dos resíduos produzidos no país. Já o Ministério da Agricultura sustenta que as quantidades de resíduos aplicados nos solos são suportados pelo preceituado em manual oficial, que todavia não abrange as espécies florestais. Quanto às eventuais atividades de fiscalização desenvolvidas pelo Ministério da Agricultura na aplicação de resíduos nos solos, desconhece-se a existência de relatórios públicos que abranjam as superfícies florestas geridas por grandes players industriais, como a Portucel Soporcel e a Altri.

Nas ações de fiscalização, está em causa não só o acompanhamento dos procedimentos de aplicação dos resíduos nos solos, mas sobretudo a monitorização subsequente sobre os potenciais impactos nos ecossistemas e para as populações rurais.


Nas áreas florestais certificadas, apesar da emissão para os consumidores dos benefícios da aquisição de produtos de base florestal certificados, o facto é que, quer o FSC quer o PEFC não têm dado garantias quanto à monitorização dos potenciais impactos associados à aplicação de resíduos nas florestas que certificam, sobretudo nas florestas geridas ou detidas por grupos industriais, eles próprios produtores desses resíduos. Sistematicamente, ou demonstram ignorar a situação, no caso do PEFC, ou manifestam grandes fragilidades na sua atuação, como é o caso do FSC. Estas atitudes geram fortes dúvidas sobre o seu

comprometimento quanto aos objetivos e às normas que os próprios sistemas de certificação definiram. Importa ter presente que tais grupos industriais representam mais de 60% das florestas certificadas pelos sistemas FSC e PEFC em Portugal.

Apesar da sua presença em Portugal há longos anos, só este ano (2014), após intervenção da Acréscimo, o FSC Portugal argumenta ter dado início ao acompanhamento da aplicação de resíduos em solos de florestas certificadas. Todavia, só este acompanhamento é manifestamente insuficiente. A obrigação, de acordo com o FSC Internacional terá de passar por exigir a monitorização contínua destas aplicações nos locais onde ocorram, reforçamos nós, logo a partir do momento em que, quer o FSC ou o PEFC, tenham procedido à certificação das entidades que permitam a aplicação de resíduos nos solos sob sua gestão.


Documentação produzida para a Comissão Europeia sustenta várias preocupações sobre a aplicação destes resíduos nos solos, seja ao nível dos teores de azoto e de fósforo nos solos, seja nos de cádmio e zinco, noutros contaminantes inorgânicos e nos contaminantes orgânicos, nos gases de efeito estufa e nos odores.

Para estarem em consonância com os objetivos e as garantias que dizem sustentar perante a Sociedade, quer o FSC quer o PEFC têm de garantir a existência de instrumentos de monitorização contínua em áreas de floresta certificada sujeitas à aplicação de resíduos urbanos e industriais. As suas ações devem ter por suporte o conhecimento científico produzido por entidades independentes, que tenham por base os ecossistemas nacionais. Isso hoje não acontece.

Para se ter uma ordem de grandeza, o governo português prevê para 2020 a produção de 750.000 toneladas anuais de lamas de depuração, mais 78,57% do que as apontadas em 2010, com a aplicação de 50% em solos agroflorestais. Outros Estados Membros são mais restritivos quanto a aplicação destes resíduos em culturas agroflorestais, ou não consideram sequer a sua aplicação, como na Holanda. Em Portugal, a pressão para a aplicação destes resíduos nos solos agroflorestais têm vindo a aumentar significativamente. As estimativas de produção de lamas de depuração em 1995 eram de 145.855 toneladas, com a aplicação de 60% em culturas agroflorestais, sendo que em 2005 a estimativa apontou para as 401.017 toneladas de lamas de depuração, com 56% aplicadas em culturas agroflorestais. As regiões do Norte, Lisboa e Vale do Tejo e do Centro assumem especial destaque neste domínio.


Com o anunciado aumento da capacidade industrial no setor da pasta e papel em Portugal, responsável por mais de 60% da área de floresta certificada no país, a pressão sobre o FSC e o PEFC está definitivamente assegurada.

(Ver versão em Inglês)

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