terça-feira, 23 de julho de 2013

O novo regime de florestação.

O Decreto-lei n.º 96/2013, publicado a 19 de julho último, vem dar expressão a uma estratégia política, que tem vigorado em Portugal nas últimas décadas, de colocar o Território e a População ao serviço de uma economia de concorrência imperfeita.

A Acréscimo saúda os atos de simplificação administrativa, de aumento da transparência dos processos de decisão, mas não se revê no simplicismo de um ato político avulso, extemporâneo, irresponsável, opaco e unidirecional. Saúda a criação de registos para efeitos estatísticos, bem como o alegado acompanhamento das dinâmicas associadas à atividade silvícola, mas insurge-se contra processos de lavagem de responsabilidades político-administrativas.

A posição da Acréscimo foi assumida há mais de um ano e condena um procedimento político medíocre de intervenção num edifício a partir do telhado, ou seja da fase de arborização, sem garantias mínimas de existência de pilares fortes nesse mesmo edifício, ou seja de gestão florestal ativa e de instrumentos que assegurem condições mínimas de rentabilidade para um investimento de alto risco como é o florestal. Ao contrário de outras campanhas agrárias do passado, a atual não é secundado pelo reforço do apoio técnico à produção, nem pelo acompanhamento dos mercados, onde é evidente o predomínio de meia dezena de grandes empresas industriais sobre centenas de milhares de micro, pequenos e médios proprietários florestais, esmagadoramente desorganizados do ponto de vista empresarial.

A aposta clara no fomento florestal em minifúndio, como decorre do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 5.º do diploma agora publicado, aporta o acréscimo de riscos significativos para a Sociedade. Com efeito, o simplicismo da comunicação prévia, associada ao investimento de rentabilidade florestal duvidosa em pequenas courelas, não dá garantias de suporte financeiro para uma gestão florestal que se pretende ativa, o que tem por consequência aumentos potenciais na propagação dos incêndios e na proliferação de pragas e de doenças. Aliás, esta aposta na florestação em pequenas courelas é incoerente com o esforço desenvolvido de constituição de Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) ou de instrumentos similares, onde a garantia de rentabilidade do investimento florestal pode ser concretizado com a dissociação entre gestão e posse dos solos, ou seja, onde a administração dos solos com ocupação florestal pode agregar simultaneamente várias propriedades.


Aludindo-se, no preâmbulo do diploma agora publicado, ao Regime Florestal de 1901, a Acréscimo lança o desafio ao Governo de, no período da legislatura (necessariamente mais curto do que o espaço de tempo, 2 anos, que levou à produção deste documento simplista), lançar um quadro jurídico abrangente, que abarque todas as fases dos ciclos produtivos florestais e garanta o desenvolvimento de um setor produtivo com características únicas a nível mundial, onde mais de 90% dos espaços florestais são privados, devidamente enquadrável nos princípios da Economia Verde, que garanta a sustentabilidade dos ecossistemas e o bem estar das populações rurais, pelo combate que pode proporcionar ao êxodo rural e ao avanço de processos de desertificação, duas chagas do nosso Território. Existe capacidade política para tal, ou fica-se o Governo pela salvaguarda de interesses empresariais específicos? Também não será com uma Estratégia Nacional para as Florestas (ENF) com notórias inconsistências graves que se responderá a este desafio.


Sem comentários:

Enviar um comentário