quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Avulsa, extemporânea, irresponsável, opaca e unidirecional.


Tudo indica que a ministra Assunção Cristas vai sujeitar a Conselho de Ministros o projeto de diploma de alteração ao licenciamento da florestação com eucalipto em minifúndio, sem garantia de condução cultural (gestão florestal) e por isso com elevado risco de incêndios florestais nos próximos anos (veja-se o histórico com o eucalipto e com o pinheiro bravo).


Depois de ter criado um clima de tensão no setor silvo-industrial, a ministra parece insistir em fazer avançar uma proposta aberrante, porquanto avulsa, extemporânea, irresponsável, opaca e unidirecional.

  • É avulsa, porquanto está desenquadrada do conjunto das carências do setor silvo-industrial português;
  • É extemporânea pois é discutida fora do âmbito da Estratégia Nacional para as Florestas, em processo arrastado (quiçá propositadamente) de avaliação;
  • É irresponsável, pois sem garantia de gestão dos novos eucaliptais (condução cultural), aumenta significativamente o risco de incêndios florestais (risco já agravado pelas alterações climáticas);
  • É opaca, por um lado surge associada ao reforço das exportações, contudo é sabido que as florestações que pretende promover só se converterão em exportações daqui a 12 anos (idade média de corte dos eucaliptos), por outro aparece em nome do rendimento dos pequenos proprietários, contudo deixa-os vulneráveis aos interesses da indústria (por menor capacidade reivindicativa),
  • É unidirecional porquanto privilegia a fileira da pasta celulósica e papel, em concreto parece estar associada a uma anunciada exigência de um grupo empresarial em particular.
A “campanha do eucalipto”, iniciativa do MAMAOT, ao contrário da “campanha do trigo” do Estado Novo, nasce órfã. Não providencia mecanismos que contrariem a concorrência imperfeita nos mercados de produtos florestais, deixando os pequenos proprietários florestais, depois da cultura instalada no terreno, à mercê das imposições unilaterais de preço por parte da indústria. Também não assegura as condições de assistência técnica aos produtores florestais, no sentido destes poderem aplicar as melhores operações silvícolas na melhoria da produtividade e na redução do risco de incêndio e da proliferação de pragas e de doenças. Curiosamente, Portugal dispõe da 5.ª maior área de eucaliptal do Mundo, muito embora a sua produtividade média reporte a 1928 (não por falta de investigação ou capacidade técnica).

Numa aparente resposta (desastrada) à manifestada exigência de um grupo empresarial (expressa em 15 de maio último no Jornal I), o Ministério faz recair as consequências dos muito prováveis desastres ambientais, económicos e sociais sobre as populações rurais em particular e sobre os contribuintes em geral. Aqui está um péssimo exemplo de defesa, pelo MAMAOT, do Interesse Público.


Este fomento do investimento lenhícola irresponsável não se coaduna com os princípios de desenvolvimento sustentável e de responsabilidade ambiental que a Acréscimo considera serem o suporte para a salvaguarda das florestas portuguesas e para o crescimento (responsável) e o reforço da internacionalização (credível) do setor florestal português.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

As florestas portuguesas em números: uma situação preocupante.


Ao longo das últimas décadas, o peso económico das florestas em Portugal evidenciou um progressivo declínio, com consequências várias ao nível social e ambiental.

Desde 1996, foi diagnosticado (Poyry, BPI, Agro.ges) que as florestas em Portugal revelavam clara evidência de subaproveitamento e de sobre-exploração.

No atual momento de crise, o valor financeiro das exportações parece ser o fator mais relevante para o Governo e para os analistas económicos, todavia existe uma grande preocupação sobre o seu impacto na degradação dos recursos naturais que, apesar de renováveis, carecem de medidas que assegurem a sua sustentabilidade.

Os atuais números sobre as florestas e a silvicultura em Portugal, baseados nas estatísticas oficiais e noutras fontes credíveis, são preocupantes:

67% representam o decréscimo do peso do Valor Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura no VAB nacional, ou seja, de 1,2% em 1990 desceu para 0,4% em 2010.
(Fonte: INE, 2012)

40% respeitam à redução do impacto das fileiras florestais no Produto Interno Bruto (PIB), de 3% em 2000 para 1,8% em 2010.
(Fonte: GPP/MAMAOT 2012).
  
1.500.000 hectares é a estimativa de solos abandonados em Portugal. Está área corresponde a 43% da superfície florestal portuguesa e a 17% da área continental de Portugal.
(Fonte. Secretaria de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, 2012).


1.500.000 hectares representam a área florestal ardida acumulada ao longo da última década (2002/2012). Está área acumulada corresponde a 43% da superfície florestal portuguesa e a 17% da área continental de Portugal.
(Fonte: ICNF, 2012)

74.200.000 Euros correspondem ao montante desperdiçado em 2012 no combate direto aos incêndios florestais, valor esse 10.3% superior ao montante gasto em 2011.
(Fource: ANPC, 2012).

1.000.000.000 Euros/ano é a estimativa do custo médio dos incêndios florestais em Portugal, quer na perspetiva ambiental quer na socioeconómica.
(Fonte: Manifesto pela floresta contra a crise, 2012).

  
2.400.000 toneladas de CO2 eq foram emitidas para a atmosfera na última década, de acordo com o recente relatório da Plataforma para o Crescimento Sustentável (PCS), em resultado dos incêndios florestais. Todavia, estudos científicos apontam para valores no mínimo 10 vezes superiores aos apontados no relatório da PCS.
(Fonte: www.atmos-chem-phys.net/11/2625/2011/).

  
5.700.000 barris de petróleo correspondem ao desperdício equivalente às perdas decorrentes dos incêndios florestais na última década. Valor esse que se aponta ser muito superior.
(Fonte: Relatório para o Crescimento Sustentável, PCS, 2012).

  
35% correspondem à média registada na distribuição da área florestal ardida em Portugal, entre 2000 e 2009, no conjunto dos 5 países do Sul da Europa.
(Fonte: Espírito Santo Research, BES, 2011).

  
100% refletem o acréscimo da área de eucalipto nos últimos 30 anos. Não estão ainda disponíveis os dados do último Inventário Florestal, todavia estima-se que as plantações de eucalipto em Portugal, com a quinta maior área a nível mundial, tenham aumentado para perto de 1 milhão de hectares. Esta evolução ocorre apesar do registo de indícios de abandono da gestão dos eucaliptais, da elevada combustibilidade da espécie e da produtividade média anual se manter em valores registados em 1928.


700.000.000 Euros correspondem ao montante de fundos públicos gastos no apoio à florestação, apenas para uma das espécies florestais portuguesas, nos últimos 20 anos. Este montante poderia ter resultado em 350 mil novos hectares com esta espécie lenhosa; contudo esta mesma espécie registou, no mesmo período, uma redução de área em cerca de 400 mil hectares. Poderão os fundos públicos utilizados no apoio à floresta ter promovido a “indústria” do fogo em Portugal?


16 anos é o período de tempo que decorreu desde a aprovação na Assembleia da República, por unanimidade, da Lei de Bases da Política Florestal, publicada em agosto de 1996. Contudo, após este período, a lei não tem concluído o seu processo de regulamentação. O processo de regulamentação da lei passou já pela mão de 7 ministros.



segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Perspetivas para 2013 nas florestas: mais papel?


O Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAMAOT) definiu, no âmbito do OE2013, as suas opções para 2013 no que respeita à política florestal:
  • Melhorar a competitividade no setor florestal, particularmente através da Estratégia Nacional para as Florestas, do Inventário Florestal Nacional e dos Planos Regionais de Ordenamento Florestal;
  • Estabelecer um programa de prevenção fitossanitária da floresta (englobando ações de prevenção estrutural e de beneficiação de áreas ardidas);
  • Operacionalizar a bolsa de terras (terras para fins agrícolas, florestais e silvopastoris).


Estratégia e planos não são mais do que processos de intenções, estes já inúmeras vezes anunciados e que, após vários anos sem concretização visível, em nada contribuem para a melhoria da competitividade do setor florestal, muito pelo contrário, só a prejudicam e colocam em causa a credibilidade do poder executivo. Para a sua concretização terão de ter implícito o envolvimento concreto dos agentes económicos e demais parceiros ligados direta e indiretamente às florestas, o que à partida pode nem estar assegurado.

Sobre tais processos de intenção, qual a calendarização prevista? Espera-se do MAMAOT algo que possa ser mensurável, até para atestar da credibilidade das anunciadas propostas.

Importa referir que a melhoria da competitividade do setor florestal não será atingível com a produção de documentos de boas intenções, nem com inventários de existências passadas, muito menos com planos de ordenamento que ora vigoram, ora são suspensos. A competitividade do setor está dependente da produtividade silvícola (a menos que a aposta seja no reforço das importações de matérias primas florestais), sendo que esta é consequência da melhoria dos rendimentos na silvicultura e, assim, de uma gestão ativa e sustentável das florestas.

O programa de prevenção fitossanitária da floresta será na verdade um plano de contenção de prejuízos, de prevenção já vem demasiado tarde. Aliás, com o governo em funções à quase dois anos, sendo este um problema premente, como se justifica só em 2013 a elaboração de um plano pelo MAMAOT? A sua concretização será ainda para 2013? Não se correrá aqui o risco de tudo acabar, como no caso do cadastro rústico, numa mera comissão?

Sobre a operacionalização da bolsa de terras, no caso concreto para fins florestais, face às especificidades da atividade silvícola, não se esperam resultados significativos, a menos que a área da Mata Nacional de Leiria e demais áreas públicas e baldias no litoral entrem em bolsa.


Efetivamente, há várias décadas que o setor tem vivido de anúncios de intenções, os resultados evidenciados são cada vez mais preocupantes. Há assim que passar a ter tolerância zero sobre mais anúncios de caráter político! Já muito papel foi escrito com propostas de intenções, no essencial não concretizadas.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Rescaldo de 2012 nas florestas: A Campanha “eucalipto na hora”.


Concluído o ato, de âmbito meramente administrativo, de fusão da Autoridade Florestal Nacional (AFN) com o Instituto de Conservação da Natureza (ICN), ao abrigo do previsto no Plano de Redução e Melhoria da Administração Central do Estado (PREMAC), de julho de 2010; assumido o falhanço, na ótica do Secretário de Estado das Florestas, da conclusão, na presente legislatura, do cadastro rústico, instrumento fundamental à implementação de políticas de ordenamento do território, onde se pode enquadrar a política florestal; resta do exercício de 2012 do MAMAOT a publicação de uma proposta de alteração legislativa ao licenciamento das arborizações e rearborizações com espécies de rápido crescimento, com destaque para o eucalipto, incontestavelmente o ato mais mediático do Ministério no passado ano.


A proposta do Ministério, para massificar a cultura do eucalipto em minifúndio, coincidiu temporalmente com a manifestação de intenções de investimento de uma empresa do setor papeleiro, ambas datadas de maio de 2012. Mas, por que razão o MAMAOT privilegia o minifúndio na sua proposta? Qual a razão para antecipar a proposta à avaliação da Estratégia Nacional para as Florestas, já em curso?

Sendo que o principal problema das florestas reside na decrescente rentabilidade do negócio silvícola e no subsequente absentismo à gestão florestal, qual a razão para o Ministério se abster de, por um lado, acompanhar o mercado dos produtos silvícolas, assegurando condições básicas para uma concorrência perfeita, e por outro, garantir serviços de assistência técnica especialmente aos pequenos proprietários florestais, com vista a assegurar as operações silvícolas mínimas, de acordo com as melhores práticas disponíveis, não só para atingir melhores produtividades, mas essencialmente para assegurar uma utilização racional e sustentável dos recursos naturais associados aos espaços florestais?

Importa ter em conta que, a ausência de uma gestão florestal ativa é a principal causadora da maior propagação dos incêndios florestais, estes últimos com elevados custos, não apenas para os proprietários florestais e para as populações rurais, os mais diretos atingidos, não apenas para a indústria que se vê na contingência de reforçar as importações, mas sobretudo para a Sociedade no seu todo, face aos elevados custos ambientais, sociais e financeiros (nos impostos) que aportam.

O facilitismo da aposta do MAMAOT na massificação do eucalipto em minifúndio é justificado com a necessidade de redução da carga burocrática. Contudo, a aposta no minifúndio parece advir da maior fragilidade dos pequenos proprietários no acesso aos mercados, bem como da menor capacidade de contestação às estratégias comerciais unilaterais da indústria. Igualmente, o minifúndio revela maior ausência de capacidade técnica para uma gestão ativa dos eucaliptais. A incapacidade de gestão por parte dos proprietários florestais em minifúndio, face à baixa rentabilidade do negócio e à ausência de assistência técnica, faz recair sobre os contribuintes os custos com os riscos do investimento em novos eucaliptais (incêndios, pragas e doenças).

Curioso é que, estando parte significativa do risco do negócio da fileira da celulose e papel nos eucaliptais, venham empresas do setor advogar a necessidade de maior área de eucalipto (40 mil hectares), sendo secundadas com a proposta do MAMAOT para o minifúndio, quando estas têm reduzido esse risco ao diminuir a suas áreas próprias de eucaliptal, as quais nos últimos 10 anos registaram uma redução superior a 33 mil hectares (fonte: Celpa, BE 2011).

Estaremos perante uma transferência do risco do negócio das grandes empresas para milhares de pequenos proprietários rústicos, ou melhor para os contribuintes, já que serão estes que, em última instância, suportam os potenciais danos?

Justifica-se assim que, a campanha do eucalipto, promovida pelo MAMAOT, não se afigura um ato político responsável.